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Boteco do "Seo Pedro"

Tiquira, a aguardente de mandioca com origem indígena, dos primórdios do Brasil

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O mundo das bebidas com graduação alcoólica é muito peculiar pela gama de produtos obtidos a partir da fermentação e destilação, como a nossa mais tradicional bebida, a cachaça, que é uma aguardente da cana-de-açúcar, assim como as aguardentes de frutas, cereais, tubérculos, dentre outras produzidas no Brasil e no mundo.

E nesse contexto, o Enfoque Business, buscou o conhecimento do historiador e especialista em cachaças, Nelson Alves. Apreciador da bebida, ostenta uma “pequena” coleção com mais de 700 rótulos de diferentes estados brasileiros, assim como de diversos municípios mato-grossenses.

Nelson é servidor público municipal em Nova Olímpia e tem compartilhado seu conhecimento em história dos destilados (principalmente a Cachaça) com nossos leitores. E hoje ele aborda informações acerca da Tiquira, a mais tradicional aguardente de mandioca (Manihot esculenta), de origem indígena no Estado do Maranhão.

Nelson: “Destilado obtido a pingos, através do beiju de mandioca fermentada”.

“Trata-se de um produto muito popular naquele Estado. Bem provável que seja a primeira bebida alcoólica brasileira, tendo surgido bem antes da Cachaça. Entretanto, há de esclarecer que a Tiquira, como fermentado veio antes, porém, não na forma destilada”, diz o historiador, reafirmando que a cachaça é o primeiro destilado das Américas.

Segundo Nelson, no livro ‘Duas viagens ao Brasil’, o escritor Hans Staden (1525- 1579) cita que antes da chegada dos portugueses, os índios brasileiros já́ bebiam um fermentado de mandioca, o cauim, também conhecido como chicha de yuka e massato pelos povos amazônicos antigos. Conforme o relato, após o cozimento em grandes panelas, as mulheres mascavam a mandioca, triturando-a com os dentes e enrolando-a no céu da boca. Elas mastigavam a mandioca com bastante saliva, cuspindo tudo num recipiente de barro com água. Aquela mistura fermentava com a ajuda das bactérias presentes na saliva, resultando no cauim, uma bebida turva, espessa e com o gosto semelhante ao soro de leite. “Essa bebida era consumida pelos adultos durante as festas na tribo, além de fazer parte do ritual canibal, antes dos grandes banquetes”, descreve.

A bebida passou da categoria de fermentada para destilada com a chegada dos portugueses (europeus) no Brasil em 1500, trazendo consigo alambiques, e o fermentado cauim, após a destilação, virou a aguardente Tiquira que possui dois possíveis significados. De acordo com Ermanno Stradelli (1852-1926), tiquira é a palavra nheengatu que significa “destilado obtido a pingos, através do beiju de mandioca fermentada”. Já para Anchieta (1534-1597), tiquira deriva da língua indígena tupi, “a gota”, por fazer referência ao gotejar do líquido durante a destilação.

Os primeiros registros históricos da Tiquira aparecem em 1855, em documentação fiscal da então chamada “Província do Maranhão”.

Atualmente, conforme Nelson, a Tiquira é produzida em diversas cidades do Maranhão, bem como no Ceará, Piauí e Bahia. A Tiquira é originalmente incolor, mas alguns produtores adicionam folhas ou flores de tangerina durante o processo de destilação, dando uma cor azulada que tende a clarear com o tempo. E a produção de Tiquira ocorre na sua grande maioria, de forma artesanal e o comércio é feito no mercado informal. São poucas as marcas que conseguem regulamentação do Ministério da Agricultura para produzir e comercializar esta bebida, transformando seu mercado potencial em um nicho de curiosos ou locais.

E, ainda, no Brasil, entre as bebidas destiladas da mandioca, apenas a Tiquira tem legislação própria. Ela deve ser obtida a partir da destilação do mosto fermentado de mandioca e possuir teor alcoólico entre 38 a 54%.

Como curiosidade, o historiador diz que há uma lenda no Maranhão, que de tão forte, após tomar três ou quatro doses de Tiquira, as pessoas não deveriam tomar banho ou molhar as cabeças, correndo o risco de morrerem ou ficarem “aluadas” ou seja, ruins da cabeça.

Os mais conservadores dizem que a tiquira é a verdadeira aguardente brasileira, já que a mandioca é genuinamente nacional. Para fortalecer essa identidade e proteger esse patrimônio, os produtores do Maranhão estão em busca de uma Indicação Geográfica reconhecida pelo INPI.

Análise sensorial da Tiquira

Em sua coleção, Nelson possui exemplares da Tiquira Aguará, produzida na região rural de São Sebastião dos Passos, na Bahia.

Ao abrir uma garrafa, ele destaca que no olfativo, a bebida lembra muito a farinha puba, tapioca fresca, o odor caraterístico das casas de farinha.

A tiquira apresenta um sabor intenso e marcante, com notas levemente adocicadas devido à mandioca. Seu aroma pode lembrar frutas secas, especiarias e toques defumados. Ao provar, a bebida entrega um retrogosto quente e persistente, característico das aguardentes de alto teor alcoólico. Dependendo da produção, pode ter nuances florais e amadeiradas.

A Tiquira pode ser apreciada pura, com gelo ou em coquetéis.

Processo de Produção da Tiquira

O site wikipedia.org traz descreve muita propriedade o processo de produção da Tiquira, que passamos a reproduzir abaixo:

“Primeiro, é necessário lavar, ralar e prensar a mandioca. Esse processo garante a retirada do veneno (íon cianeto) da matéria prima. Resultando em uma massa, que deve ser desfeita à mão, dando origem a uma grossa farofa. Em seguida, espalhá-la sobre uma superfície quente, até formar uma pasta de aproximadamente trinta centímetros de diâmetro, que deverá ser assado até se tornar beiju.

Quando os beijus resfriarem, são expostos à sombra para ocorrer a proliferação espontânea dos esporos e dos fungos do ambiente durante três ou quatro dias até se formar uma flora de micélios de cor rosada.

Tiquira Aguará – Aguardente a base de mandioca tradicional no Estado do Maranhão.

O processo leva de doze a catorze dias, quando se diminui o teor de umidade dessas massas e os micélios da superfície chegam ao interior dos beijus, contaminando e sacrificando a massa e desdobrando todo o amido.

É necessário um recipiente que deve ter, em média, duzentos litros de capacidade para se adicionar a pasta e, depois, cobrir com água. Após um dia, virará uma massa desfeita e xaroposa que deve ser mexida e agitada para se uniformizar e arejar o mosto, que, deixado exposto, completará sua fermentação alcoólica em dois dias.

Com o fim da fermentação, o mosto é destilado em alambiques de barro ou de cobre. Em cada operação, serão produzidos de quinze a vinte litros de tiquira, rendendo cerca de cem litros no total. Finalmente, a tiquira é cozida com folhas de tangerina e adquire a sua tradicional cor roxa, que serve para distingui-la da cachaça”.

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Boteco do "Seo Pedro"

Remédio contra a gripe espanhola torna-se o mais tradicional drink brasileiro

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A caipirinha, uma simples receita obtida a partir da junção da cachaça, limão, açúcar e gelo, é o drink que mais reflete a nossa brasilidade.

É conhecida e consumida nacional e internacionalmente, se tornou um dos componentes mais famosos da culinária brasileira, sendo a receita nacional mais popular no mundo todo e frequentemente considerada a melhor bebida do país e um dos melhores coquetéis/drinks do mundo, segundo o site especializado TasteAtlas (2024).

Foi o primeiro drinque brasileiro reconhecido pelo IBA-Associação Internacional de Bartenders e devido à sua importância e popularidade, a caipirinha foi declarada Patrimônio Cultural Brasileiro em 2003 e a sua receita é regida pelo Decreto Federal nº 6.871, de 2009: “Caipirinha é a bebida típica Brasileira, elaborada com cachaça, limão e açúcar, com graduação alcoólica de 15% a 36% em volume, a 20ºc, podendo ter apenas adição de água para padronização”.

Nelson Alves, historiador e entusiasta da Cachaça, servidor público em Nova Olímpia, onde possui uma pequena coleção de cachaça, com diversos rótulos de Mato Grosso e do Brasil, destaca que os historiadores divergem sobre a origem da Caipirinha.

O IBRAC (Instituto Brasileiro da Cachaça), tem como versão que a  História da Caipirinha começa no ano  de 1918, no interior do Estado de São Paulo. A composição da caipirinha se baseia em uma receita bem sucedida feita com limão, alho e mel. Um remédio caseiro da época que era então, indicada para pacientes que contraíram a gripe Espanhola (1918 – 1919). Entretanto, em um certo momento, alguém tomou a decisão de tirar o alho e o mel, e logo depois acrescentaram algumas colheres de sacarose para adoçar a bebida. Logo depois acrescentou-se o gelo, com o objetivo de tornar a bebida mais refrescante e afastar o calor.

Ainda, segundo o IBRAC, a difusão da caipirinha para o resto do Brasil teria ocorrido através da Semana de Nova Arte de 1922, em São Paulo. A bebida teria ganho grande fama entre os artistas do evento como sinal de patriotismo e amor pelo Brasil. Além disso os artistas a teriam introduzido em seus Estados de origem após o evento.

Por mais que a primeira versão seja comprovada pela Ibrac, já foi encontrado na cidade de Paraty (RJ) o registro mais antigo de uma receita de caipirinha, também utilizada como remédio, datado de 1853. Este registro procede o pedido do engenheiro civil João Pinto Gomes Lamego para um remédio que visava combater uma epidemia de cólera que acontecia na região: “…por isso, tenho provido que a necessidade obrigou a dar essa ração de aguardente temperada com água, açúcar e limão, a fim de proibir que bebessem água simples.” (Registro de Ofícios da Câmara Municipal, pag. 139, 1856).

Esta versão, mais tarde, em 2014, foi reconhecida inclusive pela Câmara Municipal de Paraty como a prova de que a bebida é originária da região e foi realizado um Projeto de Lei para reconhecer a bebida como um Patrimônio Cultural da cidade de Paraty.

Por sua vez, Luís da Câmara Cascudo (1898 – 1986), um dos mais importantes historiadores brasileiros, conta que a origem se deu no século XIX. Segundo ele, a Caipirinha teve sua criação pelas mãos dos então, latifundiários do território de Piracicaba, no estado de São Paulo. Além disso, a Caipirinha foi considerada uma bebida local e desta forma servida em festas e eventos da alta sociedade.

Conforme Câmara Cascudo, a caipirinha surgiu, para ser um substituto local de boa qualidade para o whisky e o vinho importados. Sendo assim, serviam a bebida constantemente em festas de agricultores da classe alta, vendas de gado e eventos da classe alta. Desde então, no início do século XX, nos anos 30, já era viável encontrá-la em outros Estados. Especialmente no Rio de Janeiro bem como em Minas Gerais. E logo depois se disseminou pelo país. Sendo dessa forma hoje considerada uma bebida típica do Brasil e a mais servida em bares, restaurantes e eventos.

Tem-se também, uma outra versão, citada em um artigo do jornal Gazeta do Povo do Paraná. Segundo o Jornal Gazeta do Povo, a Caipirinha teria surgido a muito mais tempo, afirmando que marinheiros que passavam pelo Estado do Rio de Janeiro, teriam então acrescentavam limão às doses de cachaça que bebiam para evitar o escorbuto.

E se não bastasse, há uma versão da origem da bebida, afirma que o nome “caipirinha” é uma homenagem à pintora Tarsila do Amaral, nascida no centro de São Paulo. Segundo esta versão, a pintora serviu a bebida às pessoas que frequentavam sua casa em Paris antes da Semana da Nova Arte de 1922. Esta versão também afirma que a bebida recebeu o nome de “caipirinha” em homenagem à pintora, que nasceu no centro de São Paulo.

Por final, temos a versão humorística de Jô Soares no livro “O Xangô de Baker Street”, em que a bebida seria inventada pelo detetive Sherlock Holmes e Watson que vêm ao Brasil para investigar o sumiço do valioso violino Stradivarius – um presente do imperador D. Pedro II à baronesa Maria Luíza. Na versão fictícia de Jô, andando pelas ruas do país, quente e úmido, Sherlock sente-se mal e vai até uma espécie de boteco para pedir uma bebida que o ajudasse a recuperar-se da hipoglicemia. A cachaça, então, é oferecida a ele como um ‘bom remédio matutino’. Porém, Watson sente o aroma e o julga muito forte. Ele sugere, então, adicionar um pouco de suco de laranja ou limão, que ajudam no combate do escorbuto. Depois, sugere colocar um pouco de gelo e açúcar para aliviar a sensação de calor do álcool. Ele coloca tudo em um copo, amassa os limões, agita rapidamente e experimenta. Os funcionários do estabelecimento observam estarrecidos, sem entender o que os homens estavam preparando. E um deles pergunta qual foi o caipira que criou aquela bebida e o segundo responde ‘o caipirinha’, se referindo a Watson, mais baixo do que Sherlock. O elemento cômico está na adição de gelo à Caipirinha, uma vez que não existiam congeladores na época.

Para Nelson Alves, não importa qual a origem seja verdadeira. O importante é que a Caipirinha é um Drink que tem a Cara do Brasileiro, estampa nos copos e taças as cores verde amarela da nossa bandeira e tem seu principal ingrediente a Cachaça, um tesouro nacional.

RECEITA DA CAIPIRINHA

Independente da origem correta, o que importa é que a versão que consumimos hoje é deliciosa e fica melhor ainda quando é servida no copo de vidro certo para você aproveitar o máximo sabor.

Veja abaixo a receita e aproveite esse drink 100% brasileiro e maravilhoso.

INGREDIENTES

1 parte de Cachaça

2 partes de açúcar

1 limão para cada parte de Cachaça

Gelo a gosto

MODO DE PREPARO

Corte os limões em 8 partes e junte com o açúcar.

Amasse bem até que o açúcar esteja diluído e, após isso, despeje a cachaça e mexa bem.

Complete com os cubos de gelo e está pronta!

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