A Câmara dos Deputados aprovou ontem (terça, 30) o projeto de lei sobre o marco temporal da ocupação de terras por povos indígenas (PL 490/07). A proposta foi enviada ao Senado.
O projeto restringe a demarcação de terras indígenas àquelas já tradicionalmente ocupadas por esses povos em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da nova Constituição federal.
O PL foi aprovado na forma de um substitutivo do relator, deputado Arthur Oliveira Maia (União-BA). Segundo o texto, para serem consideradas terras ocupadas tradicionalmente, deverá ser comprovado objetivamente que elas, na data de promulgação da Constituição, eram ao mesmo tempo habitadas em caráter permanente, usadas para atividades produtivas e necessárias à preservação dos recursos ambientais e à reprodução física e cultural.
Dessa forma, se a comunidade indígena não ocupava determinado território antes desse marco temporal, independentemente da causa, a terra não poderá ser reconhecida como tradicionalmente ocupada.
O substitutivo prevê ainda permissão para plantar cultivares transgênicos em terras exploradas pelos povos indígenas, proibição de ampliar terras indígenas já́ demarcadas, adequação dos processos administrativos de demarcação ainda não concluídos às novas regras e nulidade da demarcação que não atenda a essas regras.
Possibilidade e segurança
Deputado Arthur Oliveira Maia, relator da matéria.
Em sessão marcada para o dia 7 de junho, o Supremo Tribunal Federal (STF) pode votar uma ação sobre o tema, definindo se a promulgação da Constituição pode servir como marco temporal para essa finalidade, situação aplicada quando da demarcação da reserva indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima.
O STF já adiou por sete vezes esse julgamento. A última vez ocorreu em junho de 2022.
O relator do PL 490/07, deputado Arthur Oliveira Maia, explicou que o projeto se apoiou na decisão do próprio Supremo e disse esperar que o STF paralise o julgamento sobre o tema. Segundo o deputado, o projeto aprovado hoje vai garantir segurança jurídica para os proprietários rurais, inclusive para os pequenos agricultores. “O País não pode viver num limbo de insegurança”, afirmou.
Produtor rural em Tangará da Serra, Ricardo Manoel Arioli Silva é presidente da Comissão Nacional de Cereais, Fibras e Oleaginosas da CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil). Para ele, o Marco Temporal é uma segurança para o brasileiro, não apenas para produtores rurais. “Quem tem uma escritura de terras, emitida pelo próprio estado, agora tem uma garantia de que não vai perder… Porque se não tiver um marco, uma data limite para demarcações de áreas indígenas, toda a sociedade está ameaçada de perder, e aí é uma expropriação porque não tem indenização”, disse, mencionando riscos até mesmo para vilas e cidades.
Arioli diz ainda que não há conflitos entre produtores e indígenas, como algumas opiniões apregoam. “Não há conflito. Nossa região aqui é referência. Em Campo Novo do Parecis, por exemplo, tem três cooperativas indígenas produzindo soja e milho em suas reservas”, acrescentou.
Derrota e protesto
A aprovação é uma vitória da bancada ruralista sobre a agenda ambiental defendida pelo governo Lula (PT). Eleito com a promessa de fazer demarcações, o petista criou o Ministério dos Povos Indígenas. As ações do governo, no entanto, não se refletiram no Congresso — com a falta de articulação política, os governistas não conseguiram impedir a derrota na votação….
O Ministério dos Povos Indígenas (MPI), por sua vez, divulgou nota ontem em que classificou a aprovação do marco temporal pelos deputados federais como um “genocídio legislado”.
“O PL 490 representa um genocídio legislado porque afeta diretamente povos indígenas isolados, autorizando o acesso deliberado em territórios onde vivem povos que ainda não tiveram nenhum contato com a sociedade, nem mesmo com outros povos indígenas, cabendo ao Estado brasileiro atuar também pela proteção dos territórios onde vivem estes povos”, diz a nota.
(Redação EB, com Agência Câmara de Notícias)